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O Mito do Português em Marrocos (L-Bartqiz)

Ponte de Afoullous, Khemisset . foto Mustapha Qadery

O tema da influência portuguesa em Marrocos ultrapassa em muito os simples testemunhos edificados, como as muralhas e as fortalezas, e mesmo a própria influência da língua portuguesa na Darija marroquina, assumindo aspectos pouco esclarecidos, por vezes mesmo desconcertantes, mas sobretudo pouco estudados.

Existe de facto uma conotação do português com o inexplicável, com diversos mitos que fazem parte do imaginário marroquino, por razões mais ou menos compreensíveis, às quais não serão alheios os factos de se encontrarem enraizados em comunidades rurais, com base em histórias com origem suficientemente remota para darem largas à imaginação popular, mas de memória suficientemente recente para que os mais idosos as transmitam de geração em geração.

Podemos dizer que o mito de L-Bartqiz, com surpreendentes referências a habitantes de grutas nos confins do deserto, de pontes construídas em locais longínquos ou de condessas sedutoras com pés de camelo, é tão fascinante para os marroquinos, como o mito das mouras encantadas, dos piratas ou dos tapetes voadores é para os portugueses.

A Ponte Portuguesa de Khenifra sobre o Oued Oum Er-Rbia, num postal antigo
Uma das referências mais comuns ao mito de L-Bartqiz é a das chamadas “pontes dos portugueses”. Existem várias, sobretudo na região de Fez-Meknés, que foram preservadas por terem perdido a sua utilidade, assumindo-se como autênticos monumentos à nostalgia, situação que ainda alimenta mais o mito que já as envolve.

Mustapha El Qadery, professor e investigador da Universidade Agdal de Rabat, que tem vindo a estudar o tema das pontes dos portugueses, enquanto marca do “Mythe El Bartqiz”, refere que as “pontes portuguesas” ou “pontes dos portugueses” se situam em antigos eixos viários que perderam a sua importância, e que terão sido construídas por cativos da Batalha de Alcácer-Quibir ou “prisioneiros da pirataria”, acrescentando que  “nessa época o Rei Saadi Al-Mansour fez muitos prisioneiros europeus e utilizou-os para as grandes obras como pontes, bem como para outras construções de caracter militar, visando facilitar a deslocação do exercito marroquino”.

A teoria de que as pontes foram construídas por cativos portugueses é a mais plausível e não é nova. Convém não esquecer que só na Batalha de Alcácer-Quibir foram aprisionados 16.000 portugueses, existindo várias referências à sua utilização em trabalhos forçados.

Os prisioneiros da chamada “guerra do corso” eram sem dúvida alguma outra grande fonte de fornecimento de mão de obra para as empresas do Reino de Fez, concentrando-se nas  duas grandes prisões especializadas em receber cativos cristãos, as Masmorras de Tetuan e a Habs Kara de Meknés.

As Masmorras de Tetuan eram inclusivamente um importante centro dinamizador da própria economia local, como refere Mhammad Benaboud, ao afirmar que “das actividades bélicas e comerciais dos primeiros habitantes de Tetuan do século XVI nasceu um importante mercado de escravos. Neste contexto, as masmorras deram origem a um serviço público necessário que formou parte do sistema económico da cidade.”

Já em relação a Habs Kara, projectada por um arquitecto português cativo de Mulay Ismail, de nome Cara, era de tal modo extensa que podia acolher 50.000 cativos. Nos outros centros do corso marroquino também florescia o negócio dos cativos, como na República do Bouregreg, cujos corsários só entre 1618 e 1624 terão feito 6.000 cativos.

A conotação das pontes com os portugueses poderá assim resultar da utilização de trabalho escravo português, de trabalho especializado, como o do arquitecto Cara, ou apenas serem exemplos de um estilo importado da arquitectura portuguesa, ou seja, serem construídas “à portuguesa”. Esta importação de estilos, ou adopção de tecnologia mais eficaz aconteceu em vários domínios, como por exemplo ao nível das fortificações, como é exemplo o Borj Nord de Fez, fortaleza construída no século XVI por Ahmed El-Mansour de acordo com o modelo português, com recurso a cativos portugueses, quem sabe se projectada por um português.

A Ponte Portuguesa de Meknés sobre o Oued Boufekarane, num postal antigo
Inúmeras “pontes portuguesas” estão referenciadas, como as pontes de Khénifra, Kasbah Tadla e Boulaouane sobre o Oued Oum Er-Rbia, a ponte de Meknés sobre o Oued Boufekarane, destruída em 2002 por uma enxurrada, a ponte de Fez sobre o Oued El-Ahdam, a ponte de Lalla Mimouna sobre o Oued Fouarat, a ponte de Tânger sobre o Oued Halk, a ponte de Mohamedia sobre o Oued El-Maleh, demolida para dar lugar a uma nova ponte, a ponte de Douar Njat sobre o Oued Nja, uma ponte no bairro Seffarine em Fés El-Bali sobre o Oued Fés ou as famosas pontes de Sefrou sobre o Oued Aggai.

Ironicamente, apesar de tantas pontes construídas, os portugueses não construíram uma única para seu uso, já que a ocupação portuguesa da costa de Marrocos se confinava a praças e fortalezas de forma hermética, isoladas, sem ligações regulares com o exterior com base em rotas comerciais, estabelecendo as comunicações entre si por via marítima. Os portugueses não precisavam de pontes porque as suas saídas das praças resumiam-se a “correrias” ou almogaverias, surtidas para destruições e saques, ou tímidas recolhas de lenha.

O próprio relacionamento das praças com o exterior nos períodos de “não-guerra”, fazia-se através dos chamados “mouros de pazes”, com base em acordos de livre circulação e de trocas comerciais, nunca através de uma ocupação efectiva de territórios, nem mesmo durante o breve período em que vigorou o chamado Protectorado da Duquela.

Kasbah de Agourai . foto Outalha Hakim
Um local referenciado por presença portuguesa é a Kasbah de Agourai, situada a Sul de Meknés. Reza a lenda que o sultão Mulay Ismail contava entre as suas 500 mulheres com uma mulher portuguesa que, ao passar pelo local viu uma fonte e chamou-lhe “água do rei”, designação que deu origem ao topónimo Agourai. Nesse local Mulay Ismail mandou construir a Kasbah, a pedido da sua mulher, “para acolher portugueses“.

Agourai ou Água do Rei, o facto é que o local é identificado com a presença de famílias descendentes de cativos portugueses, que se terão estabelecido aí. Na revista “Le Maroc en Mutation” referenciada na bibliografia pode ler-se que “Fundada pelo Sultão Mulay Ismail, a cidadela de Agourai assegurava funções múltiplas: (…) _ lugar de encarceramento de piratas (vários descendentes de portugueses, supostamente, vivem ainda a Agourai com um nome arabizado)”. De entre esses nomes figura o de Ouled Bertkhiz, sendo que Ouled significa “filhos”.

Esta história é relevante no sentido de se fazer uma referência aos muitos prováveis portugueses que se terão convertido e integrado na sociedade marroquina, fossem cativos, fossem desertores, fossem degredados enviados para obter informações.

Agourai não é exemplo único. No Vale do Draa, junto a Zagora, existem ruínas de uma aldeia “de portugueses”, regularmente visitada como tal por grupos de turistas. Seriam os restícios do bando de Guerrando, o famoso Giraldo Sem Pavor quando foi desterrado para a região de Taroudant antes de lhe cortarem a cabeça “para acabar com o seus manejos“?




1 commentaire:

  1. Artigo roubado do meu blog www.historiasdeportugalemarrocos.wordpress.com. Agradeço à autora deste roubo que tenha a decência de o apagar.

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